No meu estudo das sociedades comunistas, cheguei à conclusão de que o propósito da propaganda comunista não era persuadir, nem convencer, nem informar, mas humilhar e, para isso, quanto menos ela correspondesse à realidade, melhor. Quando as pessoas são forçadas a ficar em silêncio enquanto ouvem as mais óbvias mentiras, ou, pior ainda,quando elas próprias são forçadas a repetir as mentiras, perdem de uma vez para sempre todo o seu senso de probidade… Uma sociedade de mentirosos castrados é fácil de controlar.
O culto romântico da sensibilidade concedeu autoridade moral ao sofredor. Uma pessoa que não sofresse se tornava uma pessoa com deficiências de caráter, carecendo de imaginação e sentimento.
A primeira exigência da civilização é que os homens estejam dispostos a reprimir seus instintos e apetites mais baixos: falhar nisso faz deles, precisamente porque são inteligentes, muito piores que meras bestas.
O fato psicológico é que é impossível sentir algo muito intensamente por milhões de pessoas, mas só de maneira fria e abstrata. Como disse Stalin, uma morte é uma tragédia, um milhão de mortes é uma estatística, e ele tinha razão. É por isso que precisamos recorrer a memórias individuais para tentar compreender catástrofes históricas. E, quando a condição de vítima se torna o estado normal da humanidade, a verdadeira compaixão se torna impossível: é como tentar passar um pouco de manteiga sobre um milhão de fatias de pão.
Não é fácil definir o politicamente correto com precisão, mas é fácil de reconhecer quando está presente. Ele age em mim como o som, de quando eu era criança, da unha de um professor arranhando a lousa (quadronegro) porque seu giz era muito pequeno: isso me dava arrepios na espinha. É a tentativa de reformar o pensamento tornando algumas coisas indizíveis; também é a obscena, para não dizer intimidadora, demonstração de virtude (concebida como a adesão pública às visões ‘corretas’ , isto é, ‘progressistas’) por meio de um vocabulário purificado e de sentimentos humanos abstratos. Contradizer tais sentimentos, ou não usar tal vocabulário, é colocar-se fora do grupo de homens civilizados (ou deveria eu dizer ‘pessoas’?).
“Ninguém percebeu que a perda do sentido da vergonha significa a perda da privacidade; e a perda da privacidade significa a perda da intimidade; e que a perda desta última significa a morte da profundidade. Com efeito, não existe maneira mais eficiente de produzir pessoas mais rasas e superficiais do que as deixar viver vidas completamente expostas, sem a ocultação de nada.”
“A ideia de que a liberdade é mera habilidade de um sujeito em fazer valer os seus caprichos é um tanto quanto rasa, e mal consegue capturar as complexidades da existência humana; um homem cujos apetites são sua lei nos chama a atenção não como alguém liberto, porém escravizado. E quando uma liberdade tão estreitamente concebida transforma-se no critério das políticas públicas, a dissolução da sociedade estará próxima. Nenhuma cultura que tenha na autoindulgência publicamente sancionada o seu mais alto bem pode sobreviver por muito tempo, e um egotismo radical será desencadeado, no qual quaisquer limites sobre o comportamento pessoal serão experimentados como infrações contra direitos básicos. Perceber as distinções entre o importante e o trivial, entre a liberdade de criticar ideias recebidas e a liberdade para se consumir LSD, por exemplo, é o tipo de discernimento que mantém as sociedades livres do barbarismo.”
“O sentimentalismo é o progenitor, o avô e a parteira da brutalidade”
“Para o sentimentalista, não existe criminoso, mas apenas um ambiente que não lhe deu o que devia.”
Aqueles que em voz alta declaram sofrer muito por razões triviais acabam sofrendo mesmo. A imaginação alinha a realidade.
“O sentimentalismo é o aliado da megalomania e da corrupção. O calor confortante e gratuito do sentimento é um fim em si mesmo, uma mera muleta para a autoestrada.”
“Insinuar a mentes jovens que a história humana tem sido e não é nada mais que isto, um conflito entre vítima e perpetradores, entre oprimidos e opressores, entre o bem e o mal, é fazer com que seja improvável que eles desenvolvam aquele senso de proporções sem o qual a informação não passa de uma forma superior de ignorância.”
Não há comportamento humano que seja desprovido em absoluto de precedentes: o mundo é velho demais para que as pessoas inventem maneiras totalmente novas de agir.
Hoje se considera que controlar a expressão das emoções para não ser inconveniente nem causar constrangimentos aos outros, e em nome do respeito próprio, é algo que está longe de ser admirável.
O culto do sentimento destrói a capacidade de pensar e até a consciência de que é necessário pensar.
Obtêm-se mais votos lisonjeando a vulgaridade do que a combatendo.
Explorei os vales sombrios da vida por muito tempo para que consiga me contentar com seus planaltos ensolarados por mais de algumas horas seguidas.
Levada ao extremo, a castidade deixa de ser uma virtude e torna-se, se não um vício, ao menos um estímulo a ele.
Uma cultura grosseira gera um povo vulgar, e o refinamento privado não consegue sobreviver por muito tempo aos excessos públicos.
No passado, as primeiras experiências sexuais dos jovens vinham acompanhadas de culpa; agora é a vergonha que acompanha a falta dessas experiências.
Elevar o amor romântico acima de quaisquer outras considerações pode ser uma tolice, para dizer o mínimo.
Aproveitando o assunto, deixem-me apenas contar uma história que ilustra a seriedade com que o Estado britânico encara a defesa da propriedade de seus cidadãos. Estava eu passando os olhos pelo histórico criminal de um de meus pacientes presos e descobri que, pouco tempo antes, ele fora condenado por assalto pela 57ª vez. Já que a maioria dos criminosos jubilosamente admite, sob confidência, que na realidade cometeu entre cinco e quinze vezes mais crimes do que aqueles pelos quais foi capturada, era bem possível que aquele homem tivesse praticado mais de quinhentos assaltos. E qual seria a terrível pena que recebeu por sua 57ª condenação? Uma multa de $85, provavelmente paga com o fruto de suas atividades.
Os benefícios recebidos do Estado vêm acompanhados da servidão ao Estado.
Trata-se de um duvidoso tributo ao fato de que, no final das contas, são as ideias que governam o mundo.
Quisera eu ter-lhe dado o livro do professor Hollander. Talvez, se vislumbrasse as insensatas crueldades que se podem cometer em nome das utopias, ele não me tivesse desacreditado. Em sua introdução, o professor Hollander especula por que as atrocidades nazistas se tornaram (merecidamente) tão familiares e por que suas lições foram tão bem assimiladas, ao passo que aquelas do comunismo, que não são propriamente desconhecidas e ocorreram até em escala maior do que as dos nazistas (pelo que não se deve agradecer, é claro, ao nazismo, uma vez que foi ele detido no meio de suas atrocidades), possuem ressonância emocional comparativamente pequena. Essa é uma infeliz realidade que seu livro almeja transformar. Talvez a diferença exista porque certos elementos do comunismo ainda exercem atração sobre muitos intelectuais, e ninguém quer reconhecer que seus ideais justificaram, e em parte também motivaram, assassinatos cometidos em escala jamais dantes vista. Quem não preferiria negar o significado de milhões e milhões de mortes a abandonar as próprias ilusões?
Em primeiro lugar, devemos ter em mente que liberdade e democracia não são necessariamente a mesma coisa. Determinado povo pode muito bem eleger um governo que deseje massacrar parte da população.
Na Europa, é preciso mais coragem para ser religioso do que irreligioso, ao menos se você possui certo nível de instrução.
Ainda assim, Dawkins negligencia alguns aspectos importantes da moral em que houve um retrocesso indubitável. Para dar apenas um exemplo: não obstante o enorme aumento da riqueza e do padrão de vida, tal qual indicado pelo consumo de bens materiais, o índice de delitos passíveis de sanção penal aumentou quarenta vezes ali onde ele nasceu, na Grã-Bretanha, desde o seu nascimento. Sozinho, esse aumento da criminalidade exerceu um impacto terrível sobre a qualidade de vida de milhões de pessoas, que hoje vivem sob um medo constante e justificável e têm de viver de acordo com ele. Os idosos da Grã-Bretanha, por exemplo, estão submetidos a um toque de recolher perpétuo, imposto por alguns jovens.
No meu estudo das sociedades comunistas, cheguei à conclusão de que o propósito da propaganda comunista não era persuadir, nem convencer, nem informar, mas humilhar e, para isso, quanto menos ela correspondesse à realidade, melhor. Quando as pessoas são forçadas a ficar em silêncio enquanto ouvem as mais óbvias mentiras, ou, pior ainda,quando elas próprias são forçadas a repetir as mentiras, perdem de uma vez para sempre todo o seu senso de probidade… Uma sociedade de mentirosos castrados é fácil de controlar.
O culto romântico da sensibilidade concedeu autoridade moral ao sofredor. Uma pessoa que não sofresse se tornava uma pessoa com deficiências de caráter, carecendo de imaginação e sentimento.
A primeira exigência da civilização é que os homens estejam dispostos a reprimir seus instintos e apetites mais baixos: falhar nisso faz deles, precisamente porque são inteligentes, muito piores que meras bestas.
O fato psicológico é que é impossível sentir algo muito intensamente por milhões de pessoas, mas só de maneira fria e abstrata. Como disse Stalin, uma morte é uma tragédia, um milhão de mortes é uma estatística, e ele tinha razão. É por isso que precisamos recorrer a memórias individuais para tentar compreender catástrofes históricas. E, quando a condição de vítima se torna o estado normal da humanidade, a verdadeira compaixão se torna impossível: é como tentar passar um pouco de manteiga sobre um milhão de fatias de pão.
Não é fácil definir o politicamente correto com precisão, mas é fácil de reconhecer quando está presente. Ele age em mim como o som, de quando eu era criança, da unha de um professor arranhando a lousa (quadronegro) porque seu giz era muito pequeno: isso me dava arrepios na espinha. É a tentativa de reformar o pensamento tornando algumas coisas indizíveis; também é a obscena, para não dizer intimidadora, demonstração de virtude (concebida como a adesão pública às visões ‘corretas’ , isto é, ‘progressistas’) por meio de um vocabulário purificado e de sentimentos humanos abstratos. Contradizer tais sentimentos, ou não usar tal vocabulário, é colocar-se fora do grupo de homens civilizados (ou deveria eu dizer ‘pessoas’?).
“Ninguém percebeu que a perda do sentido da vergonha significa a perda da privacidade; e a perda da privacidade significa a perda da intimidade; e que a perda desta última significa a morte da profundidade. Com efeito, não existe maneira mais eficiente de produzir pessoas mais rasas e superficiais do que as deixar viver vidas completamente expostas, sem a ocultação de nada.”
“A ideia de que a liberdade é mera habilidade de um sujeito em fazer valer os seus caprichos é um tanto quanto rasa, e mal consegue capturar as complexidades da existência humana; um homem cujos apetites são sua lei nos chama a atenção não como alguém liberto, porém escravizado. E quando uma liberdade tão estreitamente concebida transforma-se no critério das políticas públicas, a dissolução da sociedade estará próxima. Nenhuma cultura que tenha na autoindulgência publicamente sancionada o seu mais alto bem pode sobreviver por muito tempo, e um egotismo radical será desencadeado, no qual quaisquer limites sobre o comportamento pessoal serão experimentados como infrações contra direitos básicos. Perceber as distinções entre o importante e o trivial, entre a liberdade de criticar ideias recebidas e a liberdade para se consumir LSD, por exemplo, é o tipo de discernimento que mantém as sociedades livres do barbarismo.”
“O sentimentalismo é o progenitor, o avô e a parteira da brutalidade”
“Para o sentimentalista, não existe criminoso, mas apenas um ambiente que não lhe deu o que devia.”
Aqueles que em voz alta declaram sofrer muito por razões triviais acabam sofrendo mesmo. A imaginação alinha a realidade.
“O sentimentalismo é o aliado da megalomania e da corrupção. O calor confortante e gratuito do sentimento é um fim em si mesmo, uma mera muleta para a autoestrada.”
“Insinuar a mentes jovens que a história humana tem sido e não é nada mais que isto, um conflito entre vítima e perpetradores, entre oprimidos e opressores, entre o bem e o mal, é fazer com que seja improvável que eles desenvolvam aquele senso de proporções sem o qual a informação não passa de uma forma superior de ignorância.”
Não há comportamento humano que seja desprovido em absoluto de precedentes: o mundo é velho demais para que as pessoas inventem maneiras totalmente novas de agir.
Hoje se considera que controlar a expressão das emoções para não ser inconveniente nem causar constrangimentos aos outros, e em nome do respeito próprio, é algo que está longe de ser admirável.
O culto do sentimento destrói a capacidade de pensar e até a consciência de que é necessário pensar.
Obtêm-se mais votos lisonjeando a vulgaridade do que a combatendo.
Explorei os vales sombrios da vida por muito tempo para que consiga me contentar com seus planaltos ensolarados por mais de algumas horas seguidas.
Levada ao extremo, a castidade deixa de ser uma virtude e torna-se, se não um vício, ao menos um estímulo a ele.
Uma cultura grosseira gera um povo vulgar, e o refinamento privado não consegue sobreviver por muito tempo aos excessos públicos.
No passado, as primeiras experiências sexuais dos jovens vinham acompanhadas de culpa; agora é a vergonha que acompanha a falta dessas experiências.
Elevar o amor romântico acima de quaisquer outras considerações pode ser uma tolice, para dizer o mínimo.
Aproveitando o assunto, deixem-me apenas contar uma história que ilustra a seriedade com que o Estado britânico encara a defesa da propriedade de seus cidadãos. Estava eu passando os olhos pelo histórico criminal de um de meus pacientes presos e descobri que, pouco tempo antes, ele fora condenado por assalto pela 57ª vez. Já que a maioria dos criminosos jubilosamente admite, sob confidência, que na realidade cometeu entre cinco e quinze vezes mais crimes do que aqueles pelos quais foi capturada, era bem possível que aquele homem tivesse praticado mais de quinhentos assaltos. E qual seria a terrível pena que recebeu por sua 57ª condenação? Uma multa de $85, provavelmente paga com o fruto de suas atividades.
Os benefícios recebidos do Estado vêm acompanhados da servidão ao Estado.
Trata-se de um duvidoso tributo ao fato de que, no final das contas, são as ideias que governam o mundo.
Quisera eu ter-lhe dado o livro do professor Hollander. Talvez, se vislumbrasse as insensatas crueldades que se podem cometer em nome das utopias, ele não me tivesse desacreditado. Em sua introdução, o professor Hollander especula por que as atrocidades nazistas se tornaram (merecidamente) tão familiares e por que suas lições foram tão bem assimiladas, ao passo que aquelas do comunismo, que não são propriamente desconhecidas e ocorreram até em escala maior do que as dos nazistas (pelo que não se deve agradecer, é claro, ao nazismo, uma vez que foi ele detido no meio de suas atrocidades), possuem ressonância emocional comparativamente pequena. Essa é uma infeliz realidade que seu livro almeja transformar. Talvez a diferença exista porque certos elementos do comunismo ainda exercem atração sobre muitos intelectuais, e ninguém quer reconhecer que seus ideais justificaram, e em parte também motivaram, assassinatos cometidos em escala jamais dantes vista. Quem não preferiria negar o significado de milhões e milhões de mortes a abandonar as próprias ilusões?