HOMI NUM CHORA
Hoje aqui, oiando pra vancê meu pai,
To me alembrando quanto tempo faz
Que pela primeira vez na vida, eu chorei.
Não foi quando nasci pru que sei que vim berrando…
E disso ninguém se alembra, não.
Foi quando um dia eu caí…levei um trupicão,
Eu era criança. Me esfolei, a perna me doeu,
Quis chora, oiei pra vancê, que esperança.
Vancê não correu pra do chão me alevanta.
Só me oiô e me falô:
Que isso, rapaz ? Alevanta já daí…
HOMI NÃO CHORA.
Aquilo que vancê falô naquela hora,
Calou bem fundo,
pru que vancê era o maió homi do mundo.
Não sabia menti nem pra mim nem pra ninguém…
O tempo foi passando…cresci também…
Mas sempre me alembrando..
HOMI NÃO CHORA. Foi o que vancê falô.
O mundo foi me dando os solavanco,
Ia sentindo das pobreza os tranco…
Vendo as tristezas vorteá nossa famía,
E as vêiz as revorta que eu sentia era tanta,
Que me vinha um nó cego na garganta,
Uma vontade de gritá…berrá, chorá…mas quá..
Tuas palavra, pai, não me saía dos ouvido..
HOMI NÃO CHORA
Intão, mesmo sentido, eu tudo engolia
E segurava as lágrima que doía…
E elas não caía, nem com tamanho de quarqué uma dô…
Veio a guerra de 40…e eu tava lá…um homi feito,
Pronto pra defendê o Brasí.
Vancê e a mãe foram me acompanhá pra despedi.
A mãe, coitada, quando me abraçô, chorô de saluçá.
Mas, nóis dois, não.
Nóis só se oiêmo, se abracêmo e despedimo
Como dois HOMI. Sem chorá nem um pingo.
Ah, me alembro bem… era um dia de domingo.
Também quem é que pode esquecê daquele tempo ingrato?
Fui pra guerra, briguei, berrei feito um cachorro do mato,
A guerra é coisa que martrata..
Fiquei ferido… com sodade de vancês…escrevi carta
Sonhei, quase me desesperei, mas chorá, memo que era bão
Nunca chorei…
Pruque eu sempre me alembrava daquilo que meu pai falô:
HOMI NÃO CHORA.
Agora, vendo vancê aí…desse jeito…quieto..sem fala,
Inté com a barbinha rala, pru que não teve tempo de fazê..
Todo mundo im vorta, oiando e chorando pru vancê…
Eu quero me alembrá…quero segurá…quero maginá
Que nóis dois sempre cumbinemo de HOMI NÃO CHORÁ…
Quero maginá que um dia vancê vorta pra nossa casa
Pobre… e nóis vai podê de novo se vê ansim, pra conversá
Intão vem vindo um desespero, que vai tomando conta..
A dô de vê vancê ansim é tanta…é tanta, pai,
Que me vorta aquele nó cego na garganta e uma lágrima
Teimosa quase cai..
Óio de novo prôs seus cabelo branco…e arguém me diz
Agora pra oiá pela úrtima vez..que ta na hora de vancê
Embarcá.
Passo a minha mão na sua testa
Que já não tem mais pensamento….
E a dô que to sentindo aqui dentro,
Vai omentando…omentando, quage arrebentando
Os peito…e eu não vejo outro jeito senão me descurpá.
O sinhô pediu tanto pra móde eu não chorá..
HOMI NÃO CHORA… o sinhô cansô de me falá…mas, pai,
Vendo o sinhô ansim indo simbora…me descurpe, mas,
Tenho que chorá.
Já não tenho tempo para ficar dando explicação aos medianos se estou ou não perdendo a fé, porque admiro a poesia do Chico Buarque, Mário Quintana ou do Vinicius de Moraes; a voz da Maria Bethânia; os livros de Machado de Assis, Thomas Mann, Ernest Hemingway e José Lins do Rego.
Sem muitas jabuticabas na bacia, quero viver ao lado de gente humana, muito humana; que sabe rir de seus tropeços, não se encanta com triunfos, não se considera eleita para a “última hora”; não foge de sua mortalidade, defende a dignidade dos marginalizados, e deseja andar humildemente com Deus. Caminhar perto dessas pessoas nunca será perda de tempo.
Esta hora da gente ir-se embora é doída
Como é dilurida
Eu vou-me embora
E na hora vai cantar um passarinho
Porque eu vou sozinho
Eu, a viola e Deus
Pra todo aquele que só fala que eu não sei viver
Chega lá em casa pruma visitinha
Que no verso ou no reverso da vida inteirinha
Há de encontrar-me num cateretê
Cumpadi meu que envelheceu cantando
Diz que ruminando dá pra ser feliz
Por isso eu vaqueio ponteando
E assim procurando a minha flor-de-lis
Pra mim o mundo é um relógio
E o dinheiro é a mola que controla os relógios dessa vida
Se o senhor tiver tempo pra ouvir a minha história
Eu começo lhe contando
Que toda a minha vida foi um grande desencontro
Entre o tempo do relógio e as oportunidades