Esquecer não é uma coisa que possamos fazer, é algo que nos acontece ou não. A mim, não aconteceu.
Vê-la fazia-me sempre sentir como se estivesse capturando uma verdadeira raridade, como se me aproximasse com todos os cuidados, silenciosamente, de uma borboleta de cores difusas e muito belas. Sempre pensei nela como algo indefinível e raro, bem como refinado – não com outras palavras, mesmo as mais bonitas. Palavras de um autêntico conhecedor.
Não sei por que, mas da primeira vez que a vi, fiquei logo sabendo que ela era única. Não estou louco, claro, visto que sabia ser apenas um sonho, que o teria sido para sempre, se não fosse o dinheiro.
Nunca mais terei um diário, quando sair daqui. Não é uma coisa saudável. É-me benéfico, aqui, pois me dá alguém com quem conversar. Mas é uma vaidade, só escrevemos o que queremos ouvir.
Todo o mal do mundo é feito por ações e atitudes que, de início, pouca importância tiveram.
Ele é louco. Sou eu. Eu sou sua loucura. Por anos ele vem procurando algo para depositar sua loucura. E ele me encontrou.
O homem ordinário é a praga da civilização. Mas ele é tão ordinário que chega a ser extraordinário.
Tudo o que é livre e decente neste mundo está sendo encerrado em minúsculas celas por verdadeiras bestas que não se preocupam.
Há uma coisa que tenho feito muitas vezes ultimamente: olhar- me ao espelho. Em certos dias, chego a não me considerar real, tenho a impressão de que não é a minha imagem que está ali a meio metro de distância. Tenho de desviar o olhar. Volto a olhar para meu rosto, para meus olhos. Tento ver o que que meus olhos dizem… O que sou. Que razão me trouxe aqui.
Trecho do diário o de Miranda
(20 de Novembro)
Livro: O Colecionador – John Fowles