“Nesta ausência que me excita,tenho-te, à minha vontade,
numa vontade infinita…
Distância, sejas bendita!Bendita sejas, saudade!”
SAUDADE
De quem é esta saudade
que meus silêncios invade,
que de tão longe me vem?
De quem é esta saudade,
de quem?
Aquelas mãos só carícias,
Aqueles olhos de apelo,
aqueles lábios-desejo…
E estes dedos engelhados,
e este olhar de vã procura,
e esta boca sem um beijo…
De quem é esta saudade
que sinto quando me vejo?
(in Velha poesia, 1965)
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FECUNDAÇÃO
Teus olhos me olham
longamente,
imperiosamente…
de dentro deles teu amor me espia.
Teus olhos me olham numa tortura
de alma que quer ser corpo,
de criação que anseia ser criatura
Tua mão contém a minha
de momento a momento:
é uma ave aflita
meu pensamento
na tua mão.
Nada me dizes,
porém entra-me a carne a pesuasão
de que teus dedos criam raízes
na minha mão.
Teu olhar abre os braços,
de longe,
à forma inquieta de meu ser;
abre os braços e enlaça-me toda a alma.
Tem teu mórbido olhar
penetrações supremas
e sinto, por senti-lo, tal prazer,
há nos meus poros tal palpitação,
que me vem a ilusão
de que se vai abrir
todo meu corpo
em poemas.
(in Sublimação, 1928)
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ESBOÇO
Teus lábios inquietos pelo meu corpo
acendiam astros…
E no corpo da mata os pirilampos
de quando em quando,
insinuavam fosforecentes carícias…
E o corpo do silêncio estremecia,
chocalhava, com os guizos do cri-cri osculante
dos grilos que imitavam a música de tua boca…
E no corpo da noite
as estrelas cantavam
com a voz trêmula e rútila
de teus beijos…
(in Sublimação, 1928)
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REFLEXÃO
Há certas almas
como as borboletas,
cuja fragilidade de asas
não resiste ao mais leve contato,
que deixam ficar pedaços
pelos dedos que as tocam.
Em seu vôo de ideal,
deslumbram olhos,
atraem as vistas:
perseguem-nas,
alcançam-nas,
detem-nas,
mas, quase sempre,
por saciedade
ou piedade,
libertam-nas outra vez.
Ela, porém, não voam como dantes,
ficam vazias de si mesmas,
cheias de desalento…
Almas e borboletas,
não fosse a tentação das cousas rasas;
– o amor de néctar,
– o néctar do amor,
e pairaríamos nos cimos
seduzindo do alto,
admirando de longe!…
(in Sublimação, 1928)
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O RETRATO FIEL
Não creias nos meus retratos,
nenhum deles me revela,
ai, não me julgues assim!
Minha cara verdadeira
fugiu às penas do corpo,
ficou isenta da vida.
Toda minha faceirice
e minha vaidade toda
estão na sonora face;
naquela que não foi vista
e que paira, levitando,
em meio a um mundo de cegos.
Os meus retratos são vários
e neles não terás nunca
o meu rosto de poesia.
Não olhes os meus retratos,
nem me suponhas em mim.
“Amo o silêncio largo e lento/ porque ele é a voz mais verdadeira,/ é a voz do sentimento.”
Almas e borboletas,
não fosse a tentação
das cousas rasas
pairaríamos nos cimos
seduzindo do alto,
admirando de Longe!…
Ser mulher, e, oh! atroz, tantálica tristeza!
ficar na vida qual uma águia inerte, presa
nos pesados grilhões dos preceitos sociais!
(in “Cristais Partidos” 1915.)
Saudades
De quem é esta saudade
que meus silêncios invade,
que de tão longe me vem?
(trecho in “Velha poesia”, 1965.)
SAUDADE
De quem é esta saudade
que meus silêncios invade,
que de tão longe me vem?
De quem é esta saudade,
de quem?
Aquelas mãos só carícias,
Aqueles olhos de apelo,
aqueles lábios-desejo…
E estes dedos engelhados,
e este olhar de vã procura,
e esta boca sem um beijo…
De quem é esta saudade
que sinto quando me vejo?
(in Velha poesia, 1965)
Ser mulher, desejar outra alma pura e alada
para poder, com ela, o infinito transpor,
sentir a vida triste, insípida, isolada,
buscar um companheiro e encontrar um Senhor…
Ser mulher, calcular todo o infinito curto
para a larga expansão do desejado surto,
no ascenso espiritual aos perfeitos ideais…
Ser mulher, e oh! atroz, tantálica tristeza!
ficar na vida qual uma águia inerte, presa
nos pesados grilhões dos preceitos sociais!
Lembranças
Teus retratos — figuras esmaecidas;
mostram pouco, muito pouco do que foste.
Tuas cartas — palavras em desgaste,
dizem menos, muito menos
do que outrora me diziam
teus silêncios afagantes…
Só o espelho da minha memória
conserva nítida, imutável
a projeção de tua formosura,
só nos folhos dos meus sentidos
pairam vívidas
em relevo
as frases que teu carinho
soube nelas imprimir.
Sou a urna funerária de tua beleza
que a saudade
embalsamou.
Quando chegar o meu instante derradeiro
só então, mais do que eu,
tu morrerás
em mim.
Há certas almas
como as borboletas,
cuja fragilidade de asas
não resiste ao mais leve contato,
que deixam ficar pedaços
pelos dedos que as tocam.
Nunca digas com firmeza
que a mágoa apenas crucia:
a saudade é uma tristeza,
que nos dá tanta alegria!
Do sucesso na subida
nunca te orgulhes demais
muito difícil na vida
é conservar o cartaz
Do meu coração me espanto!
O amor só me deu pesar,
como tendo amado tanto
tenho ainda amor para dar?!…