AutorEugénia Tabosa

Eugénia Tabosa

Na noite sem lua
o mar todo negro
se oferece em espuma

Eugénia Tabosa

No ninho do sabiá
há quatro bocas
que não param de piar

Eugénia Tabosa

Na janela em frente
uma criança sorri –
falta-lhe um dente

Eugénia Tabosa

Por desafio
vestiu-se de gueixa
amor não sentiu

Eugénia Tabosa

No parapeito
da velha janela
a gata espreita

Eugénia Tabosa

Num vôo direto
o pássaro volta
procurando um teto

Eugénia Tabosa

teu corpo deitado
acorda desejos
não confessados

Eugénia Tabosa

Voar sempre, cansa –
por isso ela corre
em passo de dança

Eugénia Tabosa

Lá vai de saltos
dona pata apressada
correndo aos saldos

Eugénia Tabosa

no inverno, o vento
dança com as folhas
a seu contento

Eugénia Tabosa

Sentado no chão
de saco vazio
suspira o sultão

Eugénia Tabosa

na lareira rubra
o velho pinheiro
ganha asas

Eugénia Tabosa

Olhar esquivo
corpo ondulante
sonho vivo

Eugénia Tabosa

Mal o dia clareia
a passarada
em coro chilreia

Eugénia Tabosa

O gato chinês
espera sentado
pela sua vez

Eugénia Tabosa

Mar de tormento
mar de sustento –
ai, triste sina

Eugénia Tabosa

olhos baixos
serena e bela
aguarda o dia

Eugénia Tabosa

O trigal maduro
ondula ao vento…
O corvo espera.

Eugénia Tabosa

A bola baila
o gato nem olha
salta e agarra

Eugénia Tabosa

na praia a sereia
anseia que a onda
a salve da areia

Eugénia Tabosa

Gatinha meiga
ao passar da mão
seu corpo se ajeita

Eugénia Tabosa

no aconchego da terra
a semente
vive a espera

Eugénia Tabosa

com mãos de hera
enlaço teu corpo
oferto em espera

Eugénia Tabosa

Debruçado no lago
Narciso, surpreso,
se vê amado

Eugénia Tabosa

No azul do mar
golfinhos saltam –
parecem brincar

Eugénia Tabosa

Ai como grita
ao pisar o gato
a velha aflita

Eugénia Tabosa

Sobre o varal
A cerejeira prepara
O amanhecer

Eugénia Tabosa

negro e revolto
o mar de inverno
pressagía desgosto

Eugénia Tabosa

no céu de Alexandria
as estrelas falam
mitologia

Eugénia Tabosa

Olhar felino
perfil egípcio
apanha sol

Eugénia Tabosa

o rio ao lado da estrada
corre
ri à gargalhada

Eugénia Tabosa

longe noite escura
uma viola
amor murmura

Eugénia Tabosa

Um homem caminha
cabisbaixo e só:
perdeu o que não tinha

Eugénia Tabosa

Abrindo uma fresta
do carro de luxo
ele atira a meleca

Eugénia Tabosa

Na noite em silêncio
o relógio presente
marca o passado

Eugénia Tabosa

palmo a palmo
dedo a dedo
inicio teu percurso

Eugénia Tabosa

Praia deserta
no rebentar da onda
a moça espera

Eugénia Tabosa

O gato tigreiro
olha o sabiá
que voa ligueiro

Eugénia Tabosa

O gato no cio
mia e remia
canta ao desafio

Eugénia Tabosa

O senhor narigudo
tinha um olho torto
e no pé um fungo

Eugénia Tabosa

Na noite escura
um mar de espuma
chama pela lua

Eugénia Tabosa

no parque vazio
duas árvores abraçam-se
em prantos de chuva

Eugénia Tabosa

Olhando nos olhos
que o lago reflete
Narciso se esquece

Eugénia Tabosa

meus dedos-olhos
desvendam sem pressa
doces mistérios

Eugénia Tabosa

a chuva no charco
traça círculos
sem compasso

Eugénia Tabosa

Um cão sonolento
esticou as patas
e soltou um vento

Eugénia Tabosa

No prato com leite
a língua rosada
faz chap chap

Eugénia Tabosa

seus olhos felinos
horizontais oblíquos
olham parados

Eugénia Tabosa

Sentadas num fio
estão cinco andorinhas
fugidas do frio

Eugénia Tabosa

na cama de nuvens
o sol espreguiça-se
oblongo

Eugénia Tabosa

na boca da fornalha
labaredas
dançam Falla

Eugénia Tabosa

Seu olhar segue
o voo do pássaro –
será que desce?

Eugénia Tabosa

A abelha voa vai
vem volta pesada
dourada de pólen

Eugénia Tabosa

No rio, a canoa
pinta em verde
o seu reflexo.

Eugénia Tabosa

No aquário redondo
o peixe dourado
julga o mar enfadonho

Eugénia Tabosa

No embalo do rio
ao sabor da corrente
meu amor vai comigo

Eugénia Tabosa

Mar infinito
três vezes bendito
traz meu filho…

Eugénia Tabosa

O pavão parado
no parque sozinho
espera o chamado

Eugénia Tabosa

Saltando da mesa
a tulipa
foi passear

Eugénia Tabosa

nos fios
os pássaros
escrevem música

Eugénia Tabosa

Saudades
Saudades
de mim,
de ti,
quando eu
era eu,
e tu
eras tu.
Saudades
da casa,
do mar,
do tempo sem pressas,
sem dores, nem remorsos.
Saudades do pássaro
que cantava ao amanhecer
e nos dava os bons dias.
Saudades…

Eugénia Tabosa

Na noite sem lua
o mar todo negro
se oferece em espuma

Eugénia Tabosa

No ninho do sabiá
há quatro bocas
que não param de piar

Eugénia Tabosa

Na janela em frente
uma criança sorri –
falta-lhe um dente

Eugénia Tabosa

Por desafio
vestiu-se de gueixa
amor não sentiu

Eugénia Tabosa

No parapeito
da velha janela
a gata espreita

Eugénia Tabosa

Num vôo direto
o pássaro volta
procurando um teto

Eugénia Tabosa

teu corpo deitado
acorda desejos
não confessados

Eugénia Tabosa

Voar sempre, cansa –
por isso ela corre
em passo de dança

Eugénia Tabosa

Lá vai de saltos
dona pata apressada
correndo aos saldos

Eugénia Tabosa

no inverno, o vento
dança com as folhas
a seu contento

Eugénia Tabosa

Sentado no chão
de saco vazio
suspira o sultão

Eugénia Tabosa

na lareira rubra
o velho pinheiro
ganha asas

Eugénia Tabosa

Olhar esquivo
corpo ondulante
sonho vivo

Eugénia Tabosa

Mal o dia clareia
a passarada
em coro chilreia

Eugénia Tabosa

O gato chinês
espera sentado
pela sua vez

Eugénia Tabosa

Mar de tormento
mar de sustento –
ai, triste sina

Eugénia Tabosa

olhos baixos
serena e bela
aguarda o dia

Eugénia Tabosa

O trigal maduro
ondula ao vento…
O corvo espera.

Eugénia Tabosa

A bola baila
o gato nem olha
salta e agarra

Eugénia Tabosa

na praia a sereia
anseia que a onda
a salve da areia

Eugénia Tabosa

Gatinha meiga
ao passar da mão
seu corpo se ajeita

Eugénia Tabosa

no aconchego da terra
a semente
vive a espera

Eugénia Tabosa

com mãos de hera
enlaço teu corpo
oferto em espera

Eugénia Tabosa

Debruçado no lago
Narciso, surpreso,
se vê amado

Eugénia Tabosa

No azul do mar
golfinhos saltam –
parecem brincar

Eugénia Tabosa

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