AutorAníbal Beça

Aníbal Beça

No céu enfeitado,
papagaio de papel:
também vou no vôo.

Aníbal Beça

Rio na piracema,
peixes pulam nas canoas:
mendigos alegres.

Aníbal Beça

Vento de verão
vem com bafo de mormaço –
garoa ameniza.

Aníbal Beça

Doceira na noite
a negra sorriu:
canteiro de estrelas?

Aníbal Beça

Rapsódia incômoda:
ao redor do bóia-fria
moscas do canavial.

Aníbal Beça

Janela fechada:
borboleta na vidraça
dá cor ao meu dia.

Aníbal Beça

A cigarra canta
o anúncio de sua morte –
formigas na contra-dança.

Aníbal Beça

Céu de primavera
no jardim dorme a menina.
Qual a flor do sonho?

Aníbal Beça

Varrendo folhas secas
lembrei-me do mar distante:
chuá de ondas chegando.

Aníbal Beça

Silêncio de outono.
Nem o grito do carteiro…
cochicho de folhas.

Aníbal Beça

Se deu mal na praia:
menino distraído
pisa numa arraia.

Aníbal Beça

Sol no girassol.
Sombra desenha outra flor
no corpo dourado.

Aníbal Beça

Bem que me agasalho.
Galhos sem folhas lá fora
parecem ter frio.

Aníbal Beça

Coruja na cumeeira
arrepia no seu canto –
a viúva reza.

Aníbal Beça

Susto na colheita:
em vez do cupuaçu
cai a casa de vespas.

Aníbal Beça

Folha no rio
vai para o mar sem volta –
chorão se renova.

Aníbal Beça

De traje a rigor
os urubus em meneios
bailando nas nuvens.

Aníbal Beça

Folha de jornal
vem no vento ao meu pescoço;
cachecol de letras.

Aníbal Beça

Na soleira do sítio
a graúna canta
ao silêncio do sol.

Aníbal Beça

Sesta no jardim:
a borboleta me acorda.
Coça o meu nariz.

Aníbal Beça

Menino amuado
quem te deu tamanho bico
foi o tico-tico?

Aníbal Beça

Além do quentão,
só a orelha da companheira
me salva do frio.

Aníbal Beça

Dançando a quadrilha
lembrei de aulas de francês.
Onde a professora?

Aníbal Beça

Na hora do rush
o cheiro do incenso acalma:
hare-krishnas dançam.

Aníbal Beça

Regato tranquilo:
uma libélula chega
e mergulha os pés.

Aníbal Beça

Nos gestos da mão
baila a brasa do cigarro:
pisca o pirilampo.

Aníbal Beça

Sobe a piracema –
ano que vem outros peixes
nadarão de novo.

Aníbal Beça

Tempo de uiaúa:
o rio onde os peixes nascem
é o mesmo que os mata.

Aníbal Beça

Céu de primavera.
Nas açucenas floridas
dura mais o orvalho.

Aníbal Beça

Partitura alegre:
cai a chuva sobre o charco
no ritmo dos sapos.

Aníbal Beça

Na caixa postal
a mão sente a queimadura:
taturana presa.

Aníbal Beça

Ah, a sensualidade…
palmeiras se abraçando
cúmplices do vento.

Aníbal Beça

Teus olhos formam
das ázimas lágrimas
rios que retornam ao mar

Aníbal Beça

Abre o camponês
sulcos de arado na terra:
no seu rosto rugas.

Aníbal Beça

Hora do recreio:
periquitos tagarelas
brigam pelas mangas.

Aníbal Beça

Ao sol do verão
o sorvete se derrete.
Namoro desfeito.

Aníbal Beça

Abro o armário e vejo
nos sapatos meus caminhos.
Qual virá no séquito?

Aníbal Beça

Açougue nas águas:
piranhas esquartejam o boi
no meio do rio.

Aníbal Beça

Folhas do ciclame
ao vento pra lá e pra cá –
um coração pulsa.

Aníbal Beça

Gaiola se abrindo
e o haijin livre de amarras:
sabiá cantando.

Aníbal Beça

Com jeito voyeur
da soleira da janela
um pombo me espia.

Aníbal Beça

Morcego em surdina
morde e sopra o velho gato.
Não contava o pulo…

Aníbal Beça

Na casca amarela
se esconde em vão a goiaba:
tantos bem-te-vis…

Aníbal Beça

No ocaso do outono
só o carrapicho gruda
na velha calça…

Aníbal Beça

Maria-fecha-a-porta
ao toque do meu dedo:
ah plantinha tímida…

Aníbal Beça

Entre o capim seco
uma surpresa rajada:
ovos de codorna.

Aníbal Beça

A chuva já vem?
Não vem. É o marcador
cantando a quadrilha.

Aníbal Beça

Jogando a tarrafa
caboclo desfaz a lua.
Pesca estrelas de escama.

Aníbal Beça

Girassol na tarde
se curva em reverência:
o sol se vai.

Aníbal Beça

Cercada de verde
ilha na hera do muro:
uma orquídea branca.

Aníbal Beça

Em câmera lenta
preguiça na imbaubeira
passa a outro galho.

Aníbal Beça

Brilha mais ereto
o penhasco sob o sol:
ah o verão fértil.

Aníbal Beça

Sozinho na casa.
Lá fora o canto das cigarras.
Ah se não fossem elas…

Aníbal Beça

Grito de agonia:
periquito na jaqueira
preso na resina.

Aníbal Beça

Broca no bambu
deixa furos de flauta.
O vento faz música.

Aníbal Beça

Um pombo no mar
traz ao bico verde ramo:
terra à vista?

Aníbal Beça

A flor do ipê-roxo
cai deixando saudades.
Ah, a moça da tarde…

Aníbal Beça

vermelho relâmpago
irrompe do capim seco:
a cobra coral.

Aníbal Beça

Folhas do ciclame
ao vento pra lá e pra cá –
um coração pulsa.

Aníbal Beça

Na noite de inverno
o frio não é só no corpo:
as tábuas estalam.

Aníbal Beça

Quase desperdício.
Moscas sobre caquis podres
Só o sapo come.

Aníbal Beça

No embalo do vento
palmeiras se abraçam:
dois amantes?

Aníbal Beça

Apenas um gesto
e o homem é capaz de vida –
reparto o caqui.

Aníbal Beça

Fugiu-me da mão
no vento com folhas secas
a carta esperada.

Aníbal Beça

De manhã, a brisa
encrespa o igarapé
e penteia as águas.

Aníbal Beça

Já é quase dia
e a lua brilha no lago.
Ainda é primavera!

Aníbal Beça

Na calma do lago
um bufo entre a canarana:
peixe-boi respira.

Aníbal Beça

Solidão de outubro:
folhas varridas no vento
levam meu recado.

Aníbal Beça

No embalo do vento
palmeiras se abraçam:
dois amantes?

Aníbal Beça

Uma vida é só uma vida
só uma vida é vivida
melhor se for dividida
e tudo mais é só
e tudo mais é
e tudo mais
e tudo
e

Aníbal Beça

No céu enfeitado,
papagaio de papel:
também vou no vôo.

Aníbal Beça

Rio na piracema,
peixes pulam nas canoas:
mendigos alegres.

Aníbal Beça

Vento de verão
vem com bafo de mormaço –
garoa ameniza.

Aníbal Beça

Doceira na noite
a negra sorriu:
canteiro de estrelas?

Aníbal Beça

Rapsódia incômoda:
ao redor do bóia-fria
moscas do canavial.

Aníbal Beça

Janela fechada:
borboleta na vidraça
dá cor ao meu dia.

Aníbal Beça

A cigarra canta
o anúncio de sua morte –
formigas na contra-dança.

Aníbal Beça

Céu de primavera
no jardim dorme a menina.
Qual a flor do sonho?

Aníbal Beça

Varrendo folhas secas
lembrei-me do mar distante:
chuá de ondas chegando.

Aníbal Beça

Silêncio de outono.
Nem o grito do carteiro…
cochicho de folhas.

Aníbal Beça

Se deu mal na praia:
menino distraído
pisa numa arraia.

Aníbal Beça

Sol no girassol.
Sombra desenha outra flor
no corpo dourado.

Aníbal Beça

Bem que me agasalho.
Galhos sem folhas lá fora
parecem ter frio.

Aníbal Beça

Coruja na cumeeira
arrepia no seu canto –
a viúva reza.

Aníbal Beça

Susto na colheita:
em vez do cupuaçu
cai a casa de vespas.

Aníbal Beça

Folha no rio
vai para o mar sem volta –
chorão se renova.

Aníbal Beça

De traje a rigor
os urubus em meneios
bailando nas nuvens.

Aníbal Beça

Folha de jornal
vem no vento ao meu pescoço;
cachecol de letras.

Aníbal Beça

Na soleira do sítio
a graúna canta
ao silêncio do sol.

Aníbal Beça

Sesta no jardim:
a borboleta me acorda.
Coça o meu nariz.

Aníbal Beça

Menino amuado
quem te deu tamanho bico
foi o tico-tico?

Aníbal Beça

Além do quentão,
só a orelha da companheira
me salva do frio.

Aníbal Beça

Dançando a quadrilha
lembrei de aulas de francês.
Onde a professora?

Aníbal Beça

Na hora do rush
o cheiro do incenso acalma:
hare-krishnas dançam.

Aníbal Beça

Regato tranquilo:
uma libélula chega
e mergulha os pés.

Aníbal Beça

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