AutorMaria Gabriela Llansol

Maria Gabriela Llansol

Sim – digo-te, pousando as mãos nos teus joelhos – desejo encontrar alguém que me ame com bondade, e saiba ler.
– Alguém que queira ressuscitar para ti?
– Sim, alguém que tenha para comigo essa memória. Alguém que deixe espaços entre as palavras para evitar que a última se agarre à próxima que vou escrever. Alguém que admita que a cartografia dos animais e da pontuação não está ainda estabelecida. Alguém que eu possa ler diferentemente depois de me ler. Alguém que dirá aos animais e às plantas que nem sempre serão servos. Alguém que ao nos amarmos se reconheça de matéria estelar.

Maria Gabriela Llansol

Não há mais sublime sedução do que saber esperar alguém.
Compor o corpo, os objectos em sua função, sejam eles
A boca, os olhos, ou os lábios. Treinar-se a respirar
Florescentemente. Sorrir pelo ângulo da malícia.

Maria Gabriela Llansol

eu sou feliz na alegria não sentimental que se manifesta;
o que me fraccionava, partiu:
o que tende para um limite finito, desapareceu;
a mata espessa e o grande bosque florescem;
dobro-me conforme o número, género, grau, modo, tempo,
e pessoa que sou vossa.
E assino.

Maria Gabriela Llansol

Tudo aparece, tudo desaparece
se aderirmos
– todos corpos, todos almas, tanto faz –
a esta regra,
manter-nos-emos na alegria

Maria Gabriela Llansol

Como a chuva não cessasse de cair em caudais,
Tiras de tinta começaram a aparecer na fotografia
O tecto da chuva rompera o abrigo da sua alma
E o verde circulava a deriva rompendo as plantas.
Elvira deixara cair seus olhos de objectiva nas
Folhas verdes. Verificava que era sobre elas e como
Elas que sempre olhara a natureza. Ver o real
Em folhas era amá-lo ininterruptamente. Essa
Contiguidade acabara por compor uma rede
Que tinha tanto de próximo como de diferente,
E a chuva não era chuva, transparecia. Eis, pensou.
Por que chove na fotografia, por que chove
Em correntes sobre as folhas?

Maria Gabriela Llansol

⁠Sim, o tempo tomou-me tão completamente, que tenho uma data em cada mão, um acontecimento diferente em cada dedo.

Maria Gabriela Llansol

⁠Ver um animal perdido à procura do seu dono é uma dessas cenas fulgores mais pungentes em que podemos participar. Olhar uma mulher abandonada é encarar um ser amarrotado. No seu olhar e nas rugas da sua cara pode ler-se a devastação de cinza em que mergulhou.

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