Não se pode ter seletividade quando o assunto é o combate ao machismo.
O feminismo deve contemplar todas as mulheres, é necessário perceber que não dá pra lutar contra uma opressão e alimentar outra.
Minha luta diária é para ser reconhecida como sujeito, impor minha existência numa sociedade que insiste em negá-la.
A representatividade é importante, porque não basta ser mulher e mulher negra, mas tem que estar comprometida com as questões, e eu estou. Comprometida com as pautas feministas, com a questão racial, com a agenda dos direitos humanos no Brasil.
Se eu luto contra o machismo, mas ignoro o racismo, eu estou alimentando a mesma estrutura.
Quando as pessoas entendem que a gente está lutando por justiça social, por equiparação e por equidade, não tem motivo para não ser feminista.
A gente luta por uma sociedade em que as mulheres possam ser consideradas pessoas.
Ao perder o medo do feminismo negro, as pessoas privilegiadas perceberão que nossa luta é essencial e urgente, pois enquanto nós, mulheres negras, seguirmos sendo alvo de constantes ataques, a humanidade toda corre perigo.
Como negra, não quero mais ser objeto de estudo, e sim o sujeito da pesquisa.
A invisibilidade da mulher negra dentro da pauta feminista faz com que ela não tenha seus problemas nem ao menos nomeados. E não se pensa em saídas emancipatórias para problemas que nem sequer foram ditos.
O não ouvir é a tendência a permanecer num lugar cômodo e confortável daquele que se intitula poder falar sobre os Outros, enquanto esses Outros permanecem silenciados.
Numa sociedade como a brasileira, de herança escravocrata, pessoas negras vão experienciar racismo do lugar de quem é objeto dessa opressão, do lugar que restringe oportunidades por conta desse sistema de opressão. Pessoas brancas vão experienciar do lugar de quem se beneficia dessa mesma opressão. Logo, ambos os grupos podem e devem discutir essas questões, mas falarão de lugares distintos.
O falar não se restringe ao ato de emitir palavras, mas de poder existir.
A gente luta por uma sociedade em que as mulheres possam ser consideradas pessoas, que elas não sejam violentadas pelo fato de serem mulheres. Quando as pessoas entendem que a gente está lutando por justiça social, por equiparação e por equidade, não tem motivo para não ser feminista. Se você é uma pessoa inconformada com as injustiças e com as desigualdades, você é uma pessoa feminista e talvez não saiba que seja. Não tem nenhum bicho de sete cabeças. O que a gente quer, na verdade, é uma sociedade livre de desigualdades e violência.
É importante a gente desmistificar quem é este sujeito que escreve. Geralmente, o que é mostrado para nós é escrito por homens brancos, ricos ou europeus, como se nós não produzíssemos saber também, como se não tivéssemos escrevendo a História. Poder mostrar isso para as pessoas é fundamental. Escritores de diferentes lugares, as pessoas que vêm da periferia também são sujeitos pensantes, que produzem, sujeitos que escrevem. Isso gera uma identificação em pessoas que nunca foram vistas como produtoras. Há uma identificação com o que está sendo escrito e com o que se escreve. O leitor consegue se ver nestas pessoas.
Os padrões de beleza são totalmente nocivos para a construção da autoestima da criança negra e por isso é importante outros referenciais, entender que pessoas negras também pensam o mundo e que fazem parte da construção da sociedade.
Aqui no Brasil, como se criou esse mito da “democracia racial”, de que todo mundo se ama e todo mundo é legal, muitas vezes o próprio sujeito negro tem dificuldade para entender que nossa sociedade é racista.
Não dá para falar em consciência humana enquanto pessoas negras não tiverem direitos iguais e sequer forem tratadas como humanas.
Se o racismo diz que eu não sei, eu vou dizer que sei ainda mais. Pra mim é muito importante desmistificar isso. Eu quero ser eu, não quero ser idealizada nem inferiorizada. Assim como todas as pessoas, quero dizer que há dias em que sei, e dias em que não sei. Às vezes eu choro e às vezes eu rio, às vezes eu quero e às vezes eu não quero. Quero ter essa liberdade humana de ser eu.
É importante ter em mente que para pensar soluções para uma realidade, devemos tirá-la da invisibilidade. Portanto, frases como “eu não vejo cor” não ajudam. O problema não é a cor, mas seu uso como justificativa para segregar e oprimir.
Para além de se entender como privilegiado, o branco deve ter atitudes antirracistas. Não se trata de se sentir culpado por ser branco: a questão é se responsabilizar. Diferente da culpa, que leva à inércia, a responsabilidade leva à ação.